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Inscrever-seOlá, Lucas Lago aqui. Essa seria a edição de tecnologia desse mês de setembro, com uma atualização dos resultados de algumas eleições e um papo sobre alguma traquitana tecnológica usada em eleições.
Porém, os nepaleses realizaram a mais inusitada das eleições e, como me ensinaram recentemente, os fatos se impõem quando você lida com jornalismo.
Conversei com a Yam Kumari Kandel, jornalista que mora em Kathmandu e me ajudou a entender tudo o que rolou por lá. Leiam o trabalho dela na Global Press, especialmente este texto aqui, sobre jovens nepalenses que foram lutar pela Ucrânia.
Sobre os resultados da semana passada, tudo aconteceu como esperado: os noruegueses mantiveram a tradição de votar no partido trabalhista, apesar do aumento das cadeiras da extrema-direita.
| Informações Gerais | |
|---|---|
| População | 29.6 milhões |
| Eleitores | 145 mil usuários do Discord |
| Sistema de votação | Enquete online |
| Sistema de governo | Parlamentarista |
Em maio de 2015, o aplicativo de mensagens Discord foi lançado em São Francisco, e se torna popular entre gamers na internet. No mesmo ano, em setembro, o Nepal consegue promulgar uma constituição democrática. Agora, em 2025, o Discord está sendo usado para reorganizar os poderes na jovem democracia nepalense.
No início de setembro aconteceram manifestações populares que se iniciaram com os motivos tradicionais: "contra a corrupção". As manifestações se intensificaram após o governo decidir banir 26 aplicativos de redes sociais e, após casos de violência policial, os conflitos entre manifestantes e policiais se intensificaram com diversas mortes.
Entre 8 e 9 de setembro, as manifestações atingiram seu ponto máximo. Prédios públicos foram incendiados, o exército teve que intervir e o primeiro ministro renunciou. A esposa de um ex-primeiro ministro está em estado grave por conta de queimaduras sofridas quando manifestantes incendiaram sua casa.
A principal característica que a mídia internacional destacou dos protestos é a demografia. Os protestos foram liderados por jovens com menos de 28 anos, e alguns dos que morreram nos protestos estão sendo tratados como mártires.
Nas imagens que circularam na internet durante os protestos era possível ver o uso de bandeiras inspiradas no anime One Piece. O mesmo aconteceu em protestos na Indonésia e no Perú.
Isso reforçou a minha percepção de que esses protestos realmente surgiram entre jovens e a partir de comunidades online – já que símbolos como esses são bastante comuns nesses grupos e One Piece é uma mídia que debate diversos temas políticos com uma profundidade impressionante para uma história que trata de uma pessoa com 'poderes de borracha'.

E só pra pontuar como tudo foi muito "gen Z" nesses protestos. Temos vídeos de jovens no celular impedindo caminhões do exército, jovens desviando de jatos de água desses caminhões usados em protestos e jovens sendo jovens.
Após a queda do primeiro ministro, o exército assumiu o controle das ruas e começou negociações com os manifestantes para decidir quem seria o primeiro ministro interino. E aqui a energia caótica da juventude brilhou novamente.
O Discord é um aplicativo de mensagens que permite mensagens de texto, áudio e vídeo. Se você já participou de algum evento do Núcleo, provavelmente foi por meio do Discord.
Nesse aplicativo qualquer pessoa pode criar um servidor, e convidar pessoas para integrá-lo. Nesse servidor são criados canais para diferentes assuntos, além das pessoas poderem conversar individualmente usando mensagens diretas. É ótimo pra organizar as conversas da empresa.
A organização Hami Nepal que atua no país desde a constituição, organizou um servidor no Discord e usou esse servidor como um hub para organizar os protestos. O Instagram da organização tem muitos vídeos com dicas sobre como manter os protestos pacíficos e outros detalhes como as exigências dos manifestantes.
Quando o exército consultou os manifestantes para verificarem se havia alguma sugestão de nome para ocupar interinamente o cargo de primeiro-ministro, o servidor do Discord que já contava com mais de 100 mil pessoas foi usado para realizar os debates entre os manifestantes.
Organizando diversas enquetes no servidor eles decidiram que o nome da presidenta da Suprema Corte Sushila Karki, era a escolha deles. O nome dela superou outras opções como:
O acordo entre exército, juventude e políticos que ainda tinham algum poder para colocar a Sushila Karki como primeira-ministra com certeza seguiu ritos inesperados e não deve aderir a constituição. Mas o compromisso de novas eleições para o ano que vem deve ser suficiente para a manutenção dela por esses meses.
Agora é acompanhar para ver se a revolução feita pela juventude no Nepal leva a mudanças reais. Torcer para que o uso do Discord como plataforma seja um melhor presságio que o Twitter foi para a primavera árabe.
Na eleição para o Storting norueguês o partido trabalhista conseguiu mais uma vitória, aumentando a tradição secular. Conseguiu 5 assentos a mais que na eleição de 2021 e pouco mais de 28% dos votos.
O partido que se bandeou para a extrema-direita ficou em segundo, derrubando partidos de direita mais tradicional (tanto conservadores como agrarianistas perderam cadeiras).
Os trabalhistas devem formar um governo de minoria, sem se afiliar formalmente com os outros partidos de esquerda do parlamento.
A eleição da Síria está ocorrendo nesta semana (15 a 20 de setembro). Resultados na próxima edição.
A edição de hoje, apesar de ter atrapalhado minha ideia de alternância entre edições tecnológicas e edições internacionais foi muito interessante de escrever e pesquisar.
E me deu uma desculpa para falar de One Piece! Se você nunca viu nada sobre essa obra, que está com 1.160 capítulos semanais lançados no mangá e quase a mesma quantidade de episódios do anime, saiba que você está essencialmente perdendo a Odisseia moderna.
Além das batalhas Shonen com poderes sobrenaturais, temos uma obra com críticas: ao autoritarismo dos militares, à busca por armas de destruição em massa por superpotências, à supressão do ensino de história, à perseguição da ciência e ao jornalismo quando esse manipula informações para benefício próprio. Vale o investimento de tempo.
E na torcida por dias melhores no Nepal, vou encerrar com a fala do [spoiler de One Piece] na ilha [spoiler de One Piece]: Eu consigo ouvir os tambores da libertação.
Olá, Lucas Lago aqui. Nesse mês de setembro dois países em situações políticas, sociais e econômicas incrivelmente contrastantes irão eleger novos membros para o seus parlamentos.
No norte da Europa, a Noruega vai realizar uma eleição em um país onde o partido dos trabalhadores é a principal força do parlamento desde 1924, pouco mais de 100 anos. Na última vez que eles perderam a Primeira Guerra Mundial era chamada só de "Guerra Mundial".
Já no chamado "Oriente Médio", teremos a primeira eleição na Síria após a derrubada do governo Assad. O atual presidente, Ahmed al-Sharaa, decretou regras de transição para essa primeira eleição.
| Informações Gerais | |
|---|---|
| População | 5.6 milhões |
| Eleitores | 4.0 milhões |
| Sistema de votação | Voto proporcional com lista por partido |
| Sistema de governo | Monarquia parlamentarista |
| Próxima eleição | 8 de setembro |
Num roteiro que já está ficando repetitivo nessa newsletter (e em toda imprensa), a Noruega se aproxima das suas eleições de 8 de setembro vendo o espectro político à direita sendo devorado pelo extremismo.
O primeiro lugar deve ficar com o partido trabalhista principal nome do que eles chamam de "Red Bloc". Lá, e também na Suécia e na Dinamarca, a divisão Trabalhistas/Conservadores tão comum na Europa foi feita em blocos de partidos: o bloco vermelho se forma em volta de partidos de esquerda e o bloco azul com os partidos de direita.
Mas isso é a tradição norueguesa, o partido trabalhista mantém historicamente 30% dos assentos do parlamento. Às vezes um pouco mais, às vezes um pouco menos. Nem sempre consegue formar uma coalizão de governo com maioria, mas nos últimos 100 anos sempre foi a primeira força do Stortinget.
A novidade é o que ocorre no "Blue Bloc". O partido Conservador, que atualmente possui 36 cadeiras e é o maior partido do bloco, está perdendo votos a cada nova pesquisa. A projeção atual é que receba menos de 30 cadeiras. Quem vem crescendo é o "Partido Progressista", que tinha uma política liberal, mas está se tornando o expoente da direita anti-imigração europeia dentro da Noruega.
Uma coisa muito interessante da política escandinava é a existência de partidos que tem a ideologia "Agrarianista". São partidos que foram fundados por camponeses da região - antes de movimentos tradicionais de esquerda chegarem na região.
São partidos que defendem o pequeno empresário, são céticos em relação a União Europeia, mas defendem pautas sociais típicas de esquerda. Com o declínio da relevância das pautas "agrárias", a maior parte deles teve um rebranding para se chamarem partidos de "centro".
O processo de votação é bastante simples. O voto é distrital e no papel. Muito similar com o processo da Alemanha, com algumas variações que favorecem as áreas rurais na hora dos cálculos.
Na hora de votar, os procedimentos seguem uma burocracia bastante simples: você retira sua cédula de votação, marca suas escolhas, dobra seguindo os pontilhados, leva para um mesário carimbar e deposita em uma urna. Devem acontecer eleições assim desde quando a democracia foi estabelecida – e como são os resultados locais que importam, a contagem mais lenta não é algo que afeta os humores do país.
A Noruega é uma monarquia constitucional, porém, diferente de outras monarquias, o rei não tem o poder de dissolver o parlamento. A constituição proíbe eleições de meio de mandato, mesmo em caso de governos de minoria. Além disso, o parlamento norueguês, além do primeiro ministro, tem um presidente e cinco vice-presidentes. Haja latim pra escrever cartinha quando acontecer alguma crise.
| Informações Gerais | |
|---|---|
| População | 25.2 milhões |
| Eleitores | 7000 pessoas selecionadas |
| Sistema de votação | Eleições indiretas |
| Sistema de governo | Governo de transição |
| Próxima eleição | 15 a 20 de setembro |
Antes de falar da eleição em si, precisamos comentar brevemente sobre a guerra civil de 13 anos que devastou o país. A Síria era governada por Bashar al-Assad desde julho de 2000, filho do antigo ditador Hafez al-Assad.
A queda do regime dos Assads começa na Primavera Árabe, com protestos contra corrupção e autoritarismo que cresceram e viraram uma revolução. Os grupos internos de oposição se organizaram sob o nome 'Exército Livre Sírio', grupos como o Daesh (o nome certo do Estado Islâmico), o YPG (um grupo da minoria Curda, que se organiza na região autônoma que fica em Rojava no leste na Síria) também foram importantes no conflito.
No dia 2 de junho o presidente do governo de transição Ahmad Al-Sharaa criou o Alto Comitê para Eleição da Assembleia do Povo (ACEAP) para organizar o processo eleitoral, que vai substituir o parlamento provisório no poder atualmente.
O próximo parlamento contará com 210 membros, dos quais 70 serão apontados pelo presidente Al-Sharaa. Os outros serão eleitos em um processo indireto, com votos de "grupos locais selecionados", grupo que contém somente 7 mil pessoas.
Além disso, o processo eleitoral enfrentará dificuldades tremendas no norte e no sudeste do país, áreas que são controladas por minorias (como os curdos em Rojava). A violência nessas áreas já causa atrasos no processo.
Apesar do processo estar claramente enviesado pelo governo atual, existe aquela esperança de que a eleição seja uma oportunidade para fazer com que o país se torne mais democrático.
Infelizmente não consegui uma conversa com um especialista/nativo pra essa edição. Nem Sírios nem Noruegueses estavam muito abertos ou interessados a dar entrevistas.
Estou estudando essa sessão nova com notas curtas, ia chamar de "Boca de urna" - mas ainda não sei se gosto desse nome. Sugiram nomes no contato da newsletter.
Ah! Se você conhece um especialista em algum assunto que seria uma ótima pauta pra cá? Responda a essa edição com o contato! Tenho poucas referências fora do mundinho urnas eletrônicas.
Olá Lucas Lago aqui! Nessa edição vamos falar de 3 assuntos diferentes: uma votação dessa quarta-feira da CCJ no Senado, uma postagem do Trump de segunda-feira, e uma reportagem sobre fraude nas eleições brasileiras.
Ah, percebeu que a newsletter tá com cara diferente? Estamos de casa nova aqui. Migramos (o Sérgio migrou, eu nem fiz nada) do Buttondown para o Ghost. Ainda vou trabalhar pra dar um tapa no visual pra ela chegar bonita pra vocês, mas já adianto que pra escrever aqui é bem melhor.
Na edição sobre a reforma do código eleitoral, comentamos que naquele momento não haviam grandes alterações sobre as urnas e a forma de votarmos. Isso não é mais verdade.
Por 14 votos a 12, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou uma proposta para que a urna imprima os votos, permita que o eleitor confira o seu voto e depois a urna deposita esse voto em uma caixa lacrada. Algo muito similar às propostas que o próprio TSE analisa desde 2005, e já rejeitou adotar outras vezes.
Esse texto ainda tem que ser votado pelo plenário do Senado e pela Câmara dos Deputados. Depois disso, é provável que o STF julgue inconstitucional como já fez em outra oportunidade.
Não acho que ficar votando novamente a mesma legislação que já foi declarada inconstitucional é uma boa estratégia, mas não entendo nada de técnica legislativa.
Na segunda-feira o presidente dos Estados Unidos escreveu na sua conta da sua rede social sobre mudanças que pretende realizar nas eleições americanas. Traduzo o começo da postagem com a mesma quantidade de parágrafos e capslocks.
Eu vou liderar um movimento para acabar com as CÉDULAS PELO CORREIO, e também, enquanto estamos nisso, as Caríssimas, Altamente 'Imprecisas' e Seriamente Controversas MÁQUINAS DE VOTAR, que custam Dez Vezes mais que sofisticados e acurados Papéis Com Marca D'água, que são mais rápidos, e não deixam DÚVIDAS, no final da noite, de quem GANHOU, e quem PERDEU, a Eleição. Nós somos agora o único País do Mundo que usa VOTAÇÃO PELO CORREIO. Todos os outros desistiram porque ENCONTRARAM FRAUDES ELEITORAIS MASSIVAS.
A postagem é basicamente um anúncio de uma empreitada contra duas tecnologias diferentes: urnas eletrônicas e voto pelo correio.
Nos EUA, a grande maioria dos locais utiliza urnas eletrônicas de segunda geração com alguma forma de auditoria. Inclusive Trump contratou ninjas para auditar seus votos no Arizona na eleição que perdeu para o Biden. Então existe uma margem muito pequena para críticas válidas nesse front.
Já na votação pelo correio, temos bastante espaço para críticas, e um risco de fraude muito mais claro, afinal essencialmente o carteiro é um 'homem no meio'. Um ataque do tipo man-in-the-middle é, na disciplina da segurança da informação, qualquer ataque que envolva redirecionar o tráfego para permitir a interceptação de um pacote de informação entre o emissor e seu receptor.

Para evitar esse tipo de ataque temos diversos protocolos de segurança que permitem reconhecer uma conexão como legítima, mas mais importante que isso, nós tentamos sempre blindar as informações que trafegam. No caso do envio de cartas pelos correios, contamos com camadas de segurança como selos e lacres, assim o receptor consegue saber se houve alguma violação do conteúdo.
Mas, essencialmente, a confiança no correio é o que permite usarmos esse tipo de serviço sem receio de comprometimento da nossa informação. E, em eleições, a tendência é evitar o uso de sistemas baseados em confiança.
Os serviços postais de países de colonização inglesa contam com uma confiança enorme da população em geral. Os USPS americano inclusive faz transporte de diversas coisas diferentonas como: pintinhos e escorpiões vivos.
Antes de escrever alguma conclusão, preciso adicionar mais uma informação. O fato do voto não ser obrigatório nos Estados Unidos fazem com que manobras para desestimular a participação sejam parte da maleta de ferramentas dos partidos. Além de estimular quem te apoia a votar, estimular a oposição a ficar em casa é importante.
Além de não ser obrigatório, o voto é em uma terça-feira (pergunta pra alguém que trabalhar de domingo se é fácil pra ele participar da eleição aqui no Brasil). O voto pelo correio foi adotado para aumentar a participação dos eleitores – com adoção crescente e usado por mais de 30% da população.
Feitos os preâmbulos, vamos à conclusão.
O presidente Donald Trump está adotando um discurso que, apesar de tecnicamente correto quanto análise de riscos e respaldado por especialistas de segurança, aparenta ter como objetivo atrapalhar o processo eleitoral nas eleições de meio de mandato do próximo ano "acabando" com o método de votação usado por milhões de eleitores – praticamente pegando emprestada a cartilha usada aqui em 2024, quando o PL tentou cancelar metade dos votos do segundo turno se apoiando em um detalhe técnico.
A jornalista Cecília do Lago (não é minha parente) explicou no veículo gringo Global Press Journal sobre uma fraude que tem acontecido nas eleições brasileiras. Sem nenhuma relação com as urnas eletrônicas ou outras coisas que você recebeu no WhatsApp de um familiar alarmado.
A fraude consiste na criação de candidatAs fantasmas, para cumprir as regras de cotas que atualmente obrigam os partidos políticos brasileiros a terem 30% de mulheres candidatas e a gastarem 30% dos recursos públicos com essas candidaturas. As candidaturas fantasmas "ajudam" os partidos a burlar essas regras e seguir priorizando os candidatos homens.
O nosso entrevistado na edição sobre a reforma do código também comenta um pouco disso, vale a leitura. Checa lá.
A edição de hoje foi 10% mais curta que o normal. Mas muita coisa em cima da hora. Na próxima edição, voltamos a rodar pelo mundo. Temos algumas opções legais de próximo destino.
Olá, Lucas Lago aqui. Hoje vamos falar de eleições na nossa vizinha Bolívia. O país possui constituição muito inovadora, que utiliza o conceito de plurinacionalidade para legitimar os diferentes povos originários do país, mas que também serviu de pretexto para que Evo Morales permanecesse na presidência por treze anos.
Falei com duas fontes bolivianas para entender o que está rolando lá. Uma das fontes pediu que a entrevista não fosse publicada para evitar problemas no trabalho dela. A outra foi a Patrícia, do projeto Bolivia Verifica, que me ajudou demais.
Na saideira da newsletter, comento brevemente do retorno das lives de Fernando Cerimedo, estrategista de Milei, com ataques toscos à eleição brasileira.
É impossível falar de eleição na Bolívia sem mencionar Evo Morales. Então, antes de falar da eleição de agora, precisamos de uma linha do tempo com alguns dos principais acontecimentos que envolvem o cocaleiro que ascendeu à presidência.
Diferente de outros partidos de esquerda que possuem ideologias moderadas, a ideologia do Movimento ao Socialismo (MAS), partido criado por Morales, parte do princípio que “O pior pecado da humanidade é o capitalismo”.
O partido sempre foi um sucesso eleitoral. Além das 5 vitórias em eleições presidenciais, o MAS governa a Bolívia com maioria nas duas casas legislativas desde 2005. Atualmente conta com 55% dos deputados e quase 60% dos senadores.
Evo concorreu à presidência 5 vezes. Em 2002 foi derrotado por Gonzalo Sánchez de Lozada, que concorreu pelo Movimento Nacionalista Revolucionário (um partido que foi historicamente de esquerda e virou conservador-nacionalista), junto com o MBL (Movimento Bolívia Livre, juro).
Em 2005, Evo foi eleito para o mandato de 2006-2009. Durante esse mandato a Bolívia aprova uma nova constituição, deixando de ser a “República da Bolívia” para se tornar o “Estado Plurinacional da Bolívia”. Nessa nova constituição um limite de dois mandatos presidenciais é determinado.
Em 2009, Evo é eleito novamente. Nesse governo (2009-2014) ele aprofunda algumas das mudanças que a nova constituição exigia. No final desse mandato, Evo consegue uma decisão do Tribunal Constitucional Plurinacional que permite que ele concorra novamente.
A lógica da decisão é que a primeira vitória de Evo ocorreu na “República da Bolívia” e que portanto não poderia ser contabilizada para a proibição de reeleições no “Estado Plurinacional da Bolívia”.
Mesmo que juridicamente válida, a decisão foi amplamente condenada.
Evo concorre então pela terceira vez e vence. Nesse mandato (2014-2019) e no anterior Evo governou com uma ampla maioria no congresso, e conseguiu aprovar diversas reformas econômicas. Em 2016, Evo decide que irá concorrer novamente a presidência, mas para isso precisa alterar a constituição.
O referendo organizado para permitir que Evo concorra mais uma vez é derrotado. O partido apela para a suprema corte, que decide que impor limites de reeleição é contra os direitos humanos. Evo concorre pela pela quarta vez e vence.
Essa vitória é questionada pela oposição, a Organização dos Estados Americanos começa um processo de auditoria dos votos, mas antes do resultado Evo renuncia à presidência, foge do país e é sucedido pelo governo interino de Jeanine Áñez presidenta do Senado à época.
Apesar do fato de Evo ter concorrido ser claramente um dibre na democracia Boliviana, a pressão de militares e policiais para a remoção do presidente antes mesmo do fim do seu mandato foi considerada um golpe de estado.
Jeanine Áñes e parte dos seus apoiadores foram julgados e presos por esse crime em 2021.
Após 1 ano do governo interino, novas eleições foram realizadas e Luis Arce – que foi um ministro importante nos governos do Evo – é eleito. Evo Morales retorna para o país em novembro de 2020, um dia depois da posse de Arce.
O governo de Luis Arce chega ao fim com a pior crise de incumbente já vista. Em jun.24 sofreu uma estranha tentativa de golpe, onde um general tentou tomar o palácio com um tanque, mas depois de tomar uma bronca do presidente, desistiu.

O governo de Arce foi impactado negativamente pelas consequências da COVID-19, pela queda da produção de gás natural e por um conflito fratricida com Evo Morales. Arce não irá concorrer pela reeleição.
A briga entre Arce e Evo foi tão intensa que Evo deixou o MAS e tentou concorrer com um novo partido que possui o nome EVO-PUEBLO. Mas como a Bolívia exige muitas assinaturas para legalizar um partido (diferente do Canadá), ele não conseguiu e está fora do páreo pela primeira vez em mais de 20 anos.
Ao invés dos dois, o jovem Eduardo de Castillo assumiu como cabeça de chave da esquerda. Mas está ralando pra conseguir registrar 2% de intenção de voto nas pesquisas. A eleição deverá ser decidida em um segundo turno entre dois candidatos de direita: Samuel Medina e Jorge Quiroga, que estão essencialmente empatados.
A Patricia, usando dados do Observatorio de Desinformación Electoral de Bolivia Verifica, comentou que uma das principais mudanças dessa campanha é que ela saiu das ruas e migrou para o ambiente digital, incluindo o uso de IAs generativas no processo.
A frequência de desinformação aumentou em 3 vezes nas últimas semanas, e as principais plataformas usadas são Facebook, TikTok e Whatsapp.
Os principais alvos de desinformação são os candidatos à direita, mas existem ataques coordenados também contra o candidato do MAS.
O processo boliviano é muito similar ao antigo processo brasileiro: cédulas de papel, contagem nas próprias mesas de votação e atas assinadas por todas as testemunhas encaminhadas para o tribunal eleitoral e os partidos.
Uma diferença interessante é que caso um dos candidatos no primeiro turno tenha mais de 40% dos votos e pelo menos 10% de vantagem do segundo colocado, ele é eleito. Com essa regra não teríamos segundo turno entre Bolsonaro e Haddad em 2018, por exemplo.
Outra diferença vem do reconhecimento dos povos originários. Sete das 130 cadeiras da câmara são reservadas para deputados dos povos originários e decididas por regras próprias desses povos (regras de usos y costumbres).
Minha fonte comentou que existem algumas denúncias de fraude envolvendo a inserção de votos pelos oficiais responsáveis pela organização da eleição entre o fim da votação e o início da contagem – o que aqui no Brasil ficou conhecido como fraude do mesário.
A fraude do mesário é um tipo de fraude onde as urnas são ‘engravidadas’ (ballot stuffing em inglês. Consiste nos mesários adicionarem votos no lugar dos eleitores, tipicamente nos minutos finais da eleição, quando existe alguma garantia que o eleitor não apareceria para votar.
Era uma fraude comum aqui no Brasil e o desenvolvimento da urna eletrônica não contribui para sua mitigação. A adição da biometria auxilia um pouco.
Existem outros tipos de ballot stuffing como esses casos super discretos que ocorreram na última eleição do Putin na Rússia.
Existem poucas provas dessas fraudes e o relatório da OEA que apontou fraudes no processo Boliviano em 2019 foi demonstrado falho por pesquisadores americanos no ano seguinte.
Seguimos acompanhando e torcendo para um pouco de estabilidade política para nosso vizinho que já sofreu 48 tentativas de golpes de estado.
Mas falando em relatórios que foram provados falsos, Fernando Cerimedo, estrategista de Javier Milei e um ávido conspirador. Voltou a compartilhar suas duas lives sobre o processo eleitoral brasileiro em 2022.
Elas estão linkadas em seu perfil na Truth Social, em posts que levam para vídeos no Rumble. Ou seja, pouquíssimas pessoas vão ver isso.
Caso você queira saber quais os erros que ele cometeu – tem um relatório da USP que sou coautor explicando as groselhas.
* Não aceitarei críticas às minhas piadas de segunda categoria.
Como sempre, compartilhem a newsletter com seus amigos. Em breve vamos migrar para uma casa nova no Ghost e vamos dar uma repaginada nela.
Olá, Lucas Lago aqui. Voltamos nessa edição com uma pauta de tecnologia. Ainda mais interessante, vamos falar de código! Do código eleitoral e das propostas de reforma que estão sob análise do Senado.
Aproveito para deixar aqui o link de um ensaio do Lawrence Lessig sobre Código, Leis e as liberdades do ciberespaço. Não tem relação com a edição da newsletter, mas é uma baita leitura.
Como não entendo nada de legislação, pedi ajuda para a Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP. E o Dr. Luciano Caparroz Santos deu uma aula para os nossos leitores.
Trago lá no finzinho resultados da eleição no Japão. Extrema-direita e nacionalismo estão em alta por lá.
Nossas eleições possuem atualmente como base legal um código que foi elaborado no ano de 1965. Isso mesmo, 1965. Como diria o Renan, do Choque de Cultura: “Brasil é bagunça”.
Mas apesar de desenvolvido no início da ditadura, esse código organizou as atribuições do Tribunal Superior Eleitoral, instituiu o voto obrigatório e definiu regras para campanhas eleitorais.
O código sofreu diversas alterações nesses 60 anos, e outras leis, como a Lei dos Partidos, foram criadas. Mas a alteração discutida agora promete ser mais abrangente e consolidar melhor as regras das eleições no Brasil.
Em 3.ago.21 a deputada Soraya Santos (PL/RJ) apresentou o PLP 112/2021, que tem uma ementa sucinta: “Institui o Código Eleitoral”. Em 16.set.21, 44 dias depois, o projeto foi aprovado e enviado ao Senado Federal.
Achou esquisito o tempo recorde de aprovação do projeto na Câmara? Duas coisas explicam essa velocidade: estávamos em plena pandemia e o presidente da Câmara era Arthur Lira.
A pandemia forçou a Câmara a se reorganizar, por conta da impossibilidade de reuniões presenciais. Arthur Lira aproveitou para reduzir o espaço de debates. Houveram decisões de pedidos de urgência aprovados em menos de 30 segundos.
O PLP 112/2021 foi pouquíssimo debatido na Câmara e remetido para o Senado Federal, com a relatoria do senador Marcelo Castro. Nesses quase 4 anos de tramitação o projeto já recebeu 373 pedidos de emendas de outros senadores, porém houve pouco debate com instituições fora do legislativo.
O principal da minha conversa com o Dr. Luciano foram explicações sobre as principais alterações que a reforma propõe.
Do lado computacional, poucas mudanças no projeto de lei. Não tem nada sobre Inteligência Artificial, por exemplo. Muda um pouco sobre propaganda na internet e apenas define melhor quais instituições podem participar das etapas de auditoria* das urnas eletrônicas. Nesses temas, o Tribunal Superior Eleitoral continua tendo bastante autonomia para definir as regras das eleições.
Uma mudança que tem sofrido muita resistência, segundo nosso entrevistado, é a alteração da cota para mulheres. O projeto original, previa que 30% das candidaturas deveriam ser de mulheres. O texto foi substituído adaptando uma ideia proposta pela senadora Eliziane Gama, para garantir que 20% das cadeiras sejam ocupadas por mulheres.
Apesar de parecer que essa alteração vai garantir espaço para mulheres no legislativo especialmente em cidades pequenas, ele também vai permitir que candidaturas de mulheres sejam “mais baratas”, já que elas terão algumas vagas reservadas.
O código prevê 30% de gastos garantidos para mulheres. Mas, isso foi facilmente manobrado pelos partidos nos últimos anos. Pode ser que ao aumentar o espaço garantido das mulheres no legislativo, elas percam ainda mais espaço no debate eleitoral.
Atualmente o Brasil já conta com 18% de mulheres na câmara de deputados e 19% no senado. Essas mudanças terão baixo impacto a nível nacional.

A outra mudança, que particularmente é minha favorita, é a alteração nas regras de “Desincompatibilização”.
Juízes, membros do Ministério Público, policiais federais, rodoviários federais, civis e militares, guardas municipais e membros das Forças Armadas deverão se afastar de seus cargos quatro anos antes das eleições se quiserem concorrer.
Direto da Agência Senado
Isso é essencial porque em instituições com hierarquia muito rígida, pessoas no topo possuem influência desproporcional nas pessoas abaixo simplesmente por causa da estrutura. Um general, por exemplo, que possua milhares de pessoas como seus subordinados teria uma base de eleitores que o respeitam por conta dessa hierarquia.
O projeto de lei é gigantesco (quase 900 artigos!) e tem pequenas mudanças em diversas áreas. Mas acredito que as duas acima sejam as principais. Vamos continuar acompanhando a tramitação caso surjam coisas interessantes sobre tecnologias digitais abriremos uma nova edição pra focar nisso.
O governo japonês sai enfraquecido da eleição para a Câmara alta (equivalente ao Senado) desse domingo (20.jul). O principal partido da coalizão governista, o Partido Liberal Democrático (PLD), governa o país essencialmente desde o final da Segunda Guerra Mundial.
Mas nessa eleição o partido de extrema-direita Sanseito conseguiu retirar 14 cadeiras da coalizão conservadora. Esse partido é de 2020 e foi fundado pelo streamer Kazuya Kyoumoto.
A política no Japão tem seus altos e baixos, mas o partido tradicional perder espaço pro partido do Monark deles é completamente surpreendente.
O primeiro-ministro, Shigeru Ishiba, deve seguir no governo com minoria nas duas casas. E, de quebra, segue enfrentando uma alta de mais de 70% no preço do arroz.
Na próxima edição vamos falar da eleição boliviana. Vou tentar entender o racha interno no partido governista e quais as chances dos candidatos de direita.
Lembrem-se de convidar os amigos cracudos de política pra assinar a newsletter. Ah, convidem os que não se interessam também.
* Nem todas as etapas seriam classificadas como auditoria em uma definição mais rígida. Eventualmente uma edição sobre esse conceito será necessária.